A centelha que se apaga


"A gente só conhece bem as coisas que cativou - disse a raposa.
- Os homens não têm mais tempo de conhecer coisa alguma.
Compram tudo já pronto nas lojas. Mas como não existem lojas de amigos, os homens não têm mais amigos. Se tu queres um amigo, cativa-me!(...)

(...)Tu não és para mim senão uma pessoa inteiramente igual a cem mil outras pessoas. E eu não tenho necessidade de ti. E tu não tens necessidade de mim. Mas, se tu me cativas, nós teremos necessidade um do outro. Serás pra mim a única no mundo. E eu serei para ti o único no mundo(...)

(...)Mas eu não estava seguro. Lembrava-me da raposa. A gente corre risco de chorar um pouco quando se deixou cativar...”

O Pequeno Príncipe, Antoine de Saint-Exupéry


Certa vez li a cativante obra "o pequeno príncipe", desde então me questiono sobre a natureza das relações humanas. Algumas experiências pessoais me deram as mesmas conclusões da raposa: É preciso tempo para cativar uma verdadeira companhia e... Não temos necessidade real de outrem em específico, é somente o desejo de estar perto que nos mantém unidos, não por obrigação, mas por livre arbítrio. Isto vale para famílias, amigos e amantes...

Não são papeis, alianças, símbolos, amigos, lembranças, status de facebook, igreja, laços sanguíneos ou qualquer outro elemento externo que mantém a junção, é o simples desejo de dois ficarem juntos mais um tempo, avaliar se vale a pena manter contato por mais um dia com esta ou aquela pessoa, mesmo em relacionamentos à distância. Quando esta centelha de desejo se apaga, não existe mais união, apenas lembranças e não vai adiantar impor motivos, desculpas ou obrigações. Nestas horas, é melhor deixar ir embora. É melhor que fiquem ao nosso lado quem realmente queira estar. Quando ouvirmos (e mais importante, aceitarmos) a temida expressão "Acabou". Vai doer, mas tudo bem, não precisamos implorar para que fiquem e muito menos deixar a porta entreaberta na esperança para que voltem; faz parte do ciclo da vida: início, meio e fim.

Que fique bem claro aos corações: "Quem sai por escolha própria, não entra mais pela mesma porta, por amor e respeito próprios". Um vaso depois que cai pode ser colado e reconstruído, porém, nunca será igual ao vaso novo. É imperativo aceitar que o mundo dá muitas voltas, se um dia os ventos do destino forem caprichosos o suficiente para trazerem novamente alguém para dentro de nossas vidas, certamente deverão traçar novos caminhos e formarão novos vasos, pois os antigos ruíram.

Não há como adivinhar em que tempo ou lugar de nossas vidas deixamos de significar algo para alguém. Podemos lembrar de sentimentos; confissões; olhares; de estarmos sempre acompanhados, mesmo quando nem nós mesmos nos suportamos; lembramos dos planos e das promessas; lembramos que um dia quisemos viver juntos pra sempre... Mas no agora? No presente não somos mais ninguém que importe.

Deixo um poema de Vilma Galvão, sobre a leveza que deveria marcar uma despedida.


Deixo-te

Estou saindo da sua vida,
silenciosamente,
docemente...

Deixo-te a paz.
Deixo-te as lembranças.
Deixo-te as coisas
que pude lhe dar...

Partirei feliz,
pois lhe amei
mais do que me era permitido.
Amei-te muito mais
do que pude mostrar...

Deixo-te hoje
sem lágrimas
sem mágoas
apenas um sorriso no adeus
e a certeza que fui feliz.

Não me peça para ficar,
fique com as imagens do abraço
do beijo,
do amor que fizemos.

Saindo da sua vida
mas lhe deixando muito mais
do que tirei!



Deixo tua vida, minha pequena, 
da mesma forma que entrei,
como um completo estranho

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