Demônios

 


Há um texto atribuído a buda onde diz: "O homem nasce só, vive só e morre só"... Não raramente vemos nas redes social bandos de iludidos e deficientes em cognição que insistem em dizer o contrário, pois quase sempre há alguém para fazer um parto, alguém para enterrar e pessoas aos redor para se conviver... Ora... o fato que buda chama a atenção não é para a vida em isolamento, e sim que ninguém pode amar ou morrer em nosso lugar... simples assim.

Aprendemos esta lição quando estamos bem no fundo do poço e ainda assim estamos cercados de outras pessoas, paradoxal não é?! Depois de frustrantes três relacionamentos onde apenas memórias foram construídas (e algumas seria melhor que virassem pó) e onze anos desperdiçados, me encontro relembrando esta dolorosa, mas extremamente necessária lição.

Algumas batalhas aliás, são lutadas melhor quando estamos sós e contrariando o rapaz do conto "natureza selvagem", nem sempre a felicidade pode ser compartilhada e nem por isso deixa de ser verdadeira, algumas conquistas pertencem apenas a você e ponto, porque pouca gente ou ninguém vai entender (ou pior, aceitar).

Uma lição interessante de se estar apenas você com você é o "morar só".

Ahh! Chegar em casa e tirar os sapatos e ver seu sofá te esperando, cozinhar com seu próprio tempero, abrir um bom vinho e escolher entre ler um livro ou ouvir uma boa música... Tomar banho de porta aberta? Andar sem roupa pela casa? Escolher a decoração? Lavar a louça agora ou depois? Tudo à escolha do hóspede. 

Logo se descobre que não precisamos de tantos talheres e panelas; não se vive apenas de miojo e bolachas; supermercado aliás, pode ser incomodo e as vezes vira um calcanhar de Aquiles no orçamento; para quem escolheu um bichinho de estimação... dar atenção e carinho ao animalzinho as vezes é um esforço altruísta.

Além de aprender a fazer mágicas e malabarismos para o salário milagrosamente durar um mês, aprendemos "na marra" a lição que buda afirmava, estamos sós e ninguém pode viver nossa vida por nós; e isso não exclui que pessoas maravilhosas podem ir e vir dentro dessa existência que chamamos de vida.

Não é fácil, verdade, mas ser responsável pelas próprias escolhas é o que faz sentir que deixamos finalmente a fraqueza, a incapacidade e os mimos para trás. Mas será que é apenas isso mesmo?

Além de aprender a gerenciar seus gastos e gostos, o "morar só" talvez nos ensine uma das lições mais preciosas da vida humana, aprender a lidar com nossos demônios interiores (ou sombras para quem é fã de psicanálise). Por experiência própria e relatos de pessoas mais próximas, afirmo categoricamente que estes demônios aparecem muito mais fortes quando estamos sós em casa, é assustador.



Dá vontade de sair de casa, de ter visitas ou quando não for possível, estar sempre online nas redes sociais. Recentemente descobri uma habilidade desconhecida pra mim, sair de casa no raiar do sol e voltar apenas para jantar, tomar banho e dormir, chega a ser deplorável. 

Neste meio tempo, relembrei outra lição importante do "morar só", quanto mais rápido aceitamos nossos demônios e fazemos amizade com eles, melhor será. No dia em que decidi criar este blog com este nome, dias de solitude, também estava em uma solidão profunda (e esta já perdurava anos); apesar do sofrimento, é sempre bom relembrar nossas motivações.

O "morar só" é um curso de como ver seus demônios, de como lidar com estes demônios, de como conviver com estes demônios. Um bônus, é quando se vive em um lugar detestável tipo Curitiba, aí o curso se torna quase um Doutorado.

E é aqui neste ponto em que a gente aprende de fato a deixar finalmente a fraqueza, a incapacidade, mimos e muletas sentimentais... Sim, muita gente usa outrem como muleta emocional para não ficar a sós com seus demônios.



É a partir deste ponto que entendemos que não precisamos (no sentido de dependência) de ninguém, afinal, nascemos sós, vivemos sós e morreremos sós. Aprendemos a partir daqui que bons relacionamentos não são construídos com dependência um do outro. Nos permitimos a partir daqui, a viver uma boa relação sem o medo ou a insegurança de que o outro vá embora e nos deixe a mercê de nossos demônios.

Aprendemos a partir daqui que boas relações são construídos apenas pelo querer estar junto e nada mais.

Aprendemos a partir daqui o que  maturidade vai além do "morar só" e se alto sustentar e o que é se relacionar saudavelmente com alguém.

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