Rosa peregrina: Câmbio, cassete e trocador
Discutir relação é algo complicado, relação de marchas então...
Mas vamos lá! Uma boa e versátil bicicleta tem uma relação ampla, trocando em miúdos isto quer dizer que ela vai ter boa velocidade final e boa redução de esforço nas subidas; logo de cara já falam os mais afoitos: "coloca o maior cassete possível e tá tudo certo"; parece simples, mas não é tanto pois os câmbios têm limites para trabalhar; o cubo tem espaço limitado para colocar certo número de marchas; alguns fabricantes não produzem câmbios e cassetes para tal finalidade e mesmo que produzissem, o preço seria exorbitante... não pera... já são exorbitantes:
Apesar das impossibilidades econômicas ou logísticas (pois a grande maioria dos itens que descreverei aqui NÃO vendem no Brasil oficialmente), irei incluir combinações de relações que provavelmente nunca veremos pelas ruas tupiniquins.
Para começar, deveremos esclarecer que câmbios de mountain bike possuem alcance (range) bem maior que câmbios de estrada e muitas vezes seria ideais para equipar gravel bikes, porém, a puxada dos cabos presentes nos trocadores de estrada (STI ou dropshifters) é diferente da puxada dos trocadores de MTB e isso estraga muitos planos, mas não todos; ainda é possível adaptar e/ou combinar muitas peças de estrada com peças de MTB; inclusive, a bicicleta fica conhecida como mullet bike ao utilizar esta combinação.
Após anos e mais anos de incompatibilidades, alguns fabricantes começaram a rever o que estavam a oferecer ao mercado e depois da percepção quase óbvia que havia um grande buraco vazio, passaram a produzir grupos "exclusivos" para as mullet bikes, gravel e afins.
1. ROTOR 1x13 (Não tem no Brasil)
Se você tem bala na agulha, parta logo para o grupo 1x13 da ROTOR, que promete um range muito próximo aos grupos 2x11 com seu cassete de 10-52 dentes; nem perca mais tempo mendigando atenção e soluções de outros fabricantes mais conhecidos.
Grupo rotor 1x13 que promete ser tão bom quanto grupos 2x11 |
2. Shimano GRX (Não tem no Brasil)
Segundo a grande mídia, o GRX é o "primeiro e único" grupo dedicado para gravel e derivações, balela e marketing, mas não deixa de ser uma ótima opção. Está disponível nas versões 1x11, 2x11 e 2x10 e ainda mecânica ou hidráulica no que diz respeito ao acionamento dos freios. Também há a opção de pedivela com 40 ou 42 dentes nos casos de coroa única e 48-31 ou 46-30 quando do uso de coroas duplas.
Shimano GRX |
Apesar de ser um grupo dedicado para gravel, o GRX tem apenas 42 dentes no pinhão maior o que para quem é fã de grupo de uma coroa pode representar peso nas subidas. Outro ponto (ainda) negativo é a dificuldade de obtenção dos componentes, seja pelo preço, seja pela falta no mercado.
3. Shimano claris/Tourney (Tem no Brasil)
Apesar de obsoletos e com pouca indicação para uso fora de estrada, muitas bicicletas gravel brasileiras são equipadas com o grupo claris 2x8 ou tourney 2x7, ambos da shimano. A questão neste caso é que o pedivela tem 50-34 dentes e o maior cassete que pode ser utilizado, 11-32; é possível superar a maioria das subidas, mas em algum momento irá faltar redução de marchas. Apesar das limitações dos grupos, temos que convir que são opções bem acessíveis.
Shimano claris 2x8 |
4. Shimano Sora/Alivio (Tem no Brasil)
o grupo Sora apresenta muitas melhorias em relação aos grupos antecessores (claris e tourney), uma velocidade a mais, cabeamento interno, pedivela integrado e freios a disco mecânicos, porém, continua com os mesmos problemas dos grupos anteriores, pois o câmbio não tem capacidade para cassetes maiores que 11-34. A grande sacada é que o trocador sora 9v tem a mesma puxada de cabo que o trocador de mtb alivio 9v, então temos um grupo misto sora + alivio, o que já permite o uso de cassetes maiores e diminui drasticamente o balanço da corrente ao superar um obstáculo.
Dinâmica Guará com grupo misto sora/alivio |
5. Sram Apex/force/rival 1 (Não tem no Brasil, mas é possível encontrar garimpando a internet)
Estes grupos tornaram-se bem populares no Brasil para quem NÃO curte shimano (incluindo eu mesmo). O apex 1 que é o mais utilizado por exemplo, é relativamente simples, "barato" e não tão difícil de ser encontrado; O grupo vem praticamente fechado, com opção de freios mecânicos ou hidráulico; pedivela de coroa única com 42 dentes integrado e cassete de 11 velocidades 11-42... é... apenas 42 dentes, parece pesada mas é quase equivalente a relação atual da minha antares. Aqui, vale ressaltar que a SRAM utiliza um sistema diferente de troca de marchas chamado double tap e apenas por conta disso, muita gente compra, não se adapta ao sistema e deixa de usar SRAM.
SRAM apex 1 |
Bem diferente de sua concorrente japonesa, a SRAM oferece uma gama até que vasta de opções. É possível utilizar os grupos tanto em asfalto quanto em estradas de terra e ainda combinar cassetes e pedivelas de diferentes linhas. A mancada da marca norte-americana é obrigar a utilizar padrões de montagem que nenhum outro grupo utilizar, como o XD hub por exemplo, mas ainda assim, são excelentes opções.
Grande variedade de combinações SRAM |
6. Microshift advent e advent X (Não tem no Brasil)
De longe a opção mais econômica e não deixa nada a desejar em relação a fabricantes mais conhecidos, porém, a microshift é muito mal representada pela WIP importações no Brasil; a empresa simplesmente não responde emails, não atende telefones e não têm informações concretas sobre grupos; Apesar de no site brasileiro e nas mídias sociais da marca constar uma baita propaganda destes dois grupos, NÃO TEM NO BRASIL e, quando se obtem uma resposta, aparentemente um robô responde no facebook da empresa com a frase: "o navio está chegando ao Brasil". O pior é que tudo o que é importado pela WIP é da pior versão possível, se existem duas versões de câmbio, uma com trava e outra sem trava, só aparecem as versões sem trava; se o câmbio tem braço longo, médio e curto...adivinhem?! Só aparecem os longos no mercado, (isso quando aparecem). Uma pena mesmo.
O grupo advent vai na contra-mão das grande marcas e tem 9 velocidades, porém, é o grupo mais versátil lançado recentemente, são quatro opções de trocadores (thumb, bar-end, flat e dropshifter), cassete 11-42 ou 11-46 e quatro versões de câmbio com opções de 1x9 com e sem trava; e opções 2x9 com e sem trava também (a trava reduz o balanço da corrente), o preço: a partir de $ 129,00 doletas, mesmo com o dólar nas alturas (hoje R$ 5,5 reais), o grupo é muito atraente.
Microshift advent |
Já o grupo advent X conta com 10 velocidades, porém, tem como opcionais apenas os trocadores: flat ou dropshifters. O cassete tem 11-48 e não precisa de nada de anormal para ser instalado.
Microshift advent X |
7. Microshift XCD ou XLE + microshift XLE (Não tem no Brasil)
Aqui uma combinação de dez ou onze velocidades para quem não gosta de shimano e muito menos SRAM (também meu caso). É possível utilizar um câmbio microshift XCD ou XLE com os trocadores dropshifters XLE sem maiores problemas, o detalhe é que o câmbio XCD funciona com pinhões de até 46 dentes e ainda tem a trava para reduzir as imperfeições da corrente. O site oficial da microshift informa ainda que o câmbio XCD funciona também com trocadores de mtb da shimano de 10 ou 11 velocidades, então para quem não gosta do número excessivo de marchas, pode ser uma opção bem viável.
Cambio microshift RD-865M |
Já o trocador XLE, é tão versátil que além de funcionar com câmbios XCD e XLE, também funciona com câmbios shimano dynasys.
Drop shifter Microshift XLE |
8. Sensah SRX (Não tem no Brasil)
Um conjunto de trocadores e câmbio projetado para 1x11, cabeamento interno, double tap e range de até 52 dentes parece bom, mas basta comentar que é um produto chinês que a maioria já torce o nariz; ainda assim, este é um grupo que não é bom desprezar, pois custa muito pouco e em sites como aliexpress, tem avaliações cheias de estrelas. Infelizmente não há muitos reviews aprofundados sobre esta combinação.
Câmbio Sensah SRX pro |
Trocador sensah SRX pro |
9. Adaptações (Não tem no Brasil)
Existem muita gambiarras espalhas mundo à fora, as mais legais são os trocadores de bar end da microshift e os retroshifters da gevenalle. Ambos são obviamente trocadores, mas na hora da compra é possível escolher com qual sistema o trocador irá funcionar. Como exemplos temos:
retroshifter gevenalle + Sram eagle 12V |
Bar-end shifter + shimano SLX 12 V |
Que grupo escolher?
A resposta desta pergunta é relativamente simples: "depende do uso". Oras, a SRAM por exemplo indica seus grupos de acordo com o uso pretendido; então, seguindo esta linha de raciocínio, fazer cicloturismo com um grupo 1x13 é dar um tiro no pé, pois imagine a dificuldade de regulagem ou ainda o custo de manutenção a cada tantos quilômetros e se pensarmos a longo prazo, até reposição de peças. O mesmo vale para competição com grupos mais limitados.
Para quem não tem muita noção de relação e como ela afeta a pedalada, aconselho um grupo de entrada, como o tourney ou o claris, pois apesar de não indicados para atividades gravel, entregam uma gama muito boa de marchas e dai em diante é possível treinar, conhecer e escolher um próximo grupo que atenda melhor, sem excesso de marchas.
Para quem não tem muita noção de relação e como ela afeta a pedalada, aconselho um grupo de entrada, como o tourney ou o claris, pois apesar de não indicados para atividades gravel, entregam uma gama muito boa de marchas e dai em diante é possível treinar, conhecer e escolher um próximo grupo que atenda melhor, sem excesso de marchas.
Vimos que oficialmente no Brasil só temos grupos "pouco indicados" para uso gravel (para não usar adjetivos mais pejorativos), e só isso já complica bastante a coisa toda; inclusive, um dos motivos de eu ter colocado o grupo sensah foi sua facilidade de obtenção. Esta facilidade/dificuldade de obtenção deve ser levada em conta na hora da escolha, pois imagine ter que trocar um parafuso que seja e ter que esperar pelo menos 15 dias para chegar ao país.
Em relação à escolha entre um grupo de 1x ou 2x, a diferença pode ser a seguinte: Um grupo de 38 dentes na coroa da frente com um pinhão de 11 dentes atrás chega a 39 km/h com 85 voltas no pedivela por minuto, já um grupo com 50 dentes na coroa da frente com pinhão de 11 dentes na traseira, chega a 51,5 km/h com as mesmas 85 voltas por minuto no pedivela. Então, para quem pedala predominantemente em asfaltos planos, este dado é importante; já para quem pedala predominantemente em terrenos irregulares ou não consegue manter um giro alto, dificilmente irá notar a diferença.
Em relação à escolha entre um grupo de 1x ou 2x, a diferença pode ser a seguinte: Um grupo de 38 dentes na coroa da frente com um pinhão de 11 dentes atrás chega a 39 km/h com 85 voltas no pedivela por minuto, já um grupo com 50 dentes na coroa da frente com pinhão de 11 dentes na traseira, chega a 51,5 km/h com as mesmas 85 voltas por minuto no pedivela. Então, para quem pedala predominantemente em asfaltos planos, este dado é importante; já para quem pedala predominantemente em terrenos irregulares ou não consegue manter um giro alto, dificilmente irá notar a diferença.
Confesso que neste tópico, não fiz uma escolha definitiva. A certeza aqui é a de não utilizar shimano, pois mesmo após anos de hegemonia, não conseguiu desenvolver nada muito adequado à realidade do mercado gravel (e a um preço justo). Pela imposição de se utilizar novos encaixes e cada vez mais caros, a SRAM também fica de fora para mim.
As chances de escolher um grupo de nove velocidades da microshift é grande, pela simplicidade e durabilidade; ou como segunda opção, a combinação utilizada pela decathlon na sua triban RC 120 GRVL 2020, um XLE de 10 velocidade com cassete 11-42 ou 11-46 e quem sabe um pedivela único de 38-40 dentes.
Triban RC 120 gravel, com o grupo microshift XLE de 10 velocidades...como de costume, não disponível no Brasil |
Prezado, sua postagem se encontra com minha atual necessidade. Estou montando uma monstercross (quadro MTB + guidão drop + freios a disco). Nas minhas pesquisa notei que os grupos road 11 velocidades da Sram se 'encaixam' perfeitamente com os cambios traseiros MTB 10 velocidades. Assim é possível comprar um cambio Sram 10v antigo (X7 / X9 / X0) com trava ou não e usar um passador/shifter/brifter da Sram. Na minha visão, o mais interessante é abraçar os passador/shifter/brifter da Sensah, que pelos comentários, na ultima versão está com muito boa qualidade! Obrigado por trazer esse conteúdo em português, com uma linguagem clara e simples, colocando a impressão de alguém que ainda está pensando em economizar na construção da bicicleta.
ResponderExcluirBons pedais.
Minhas fontes >>>>
entendendo a intercompatibilidade entre grupos e sistemas: http://blog.artscyclery.com/science-behind-the-magic/science-behind-the-magic-drivetrain-compatibility/ ;
intercompatibilidade
passadores Sensah: https://www.cyclabo.com/topics/d61xc4qiv9/#empire-1x11s-2x11s ;
entre os passadores traseiros e passadores: https://www.bikeradar.com/advice/buyers-guides/a-complete-guide-to-rear-derailleurs/ .
Olá Vinícius, fico muito grato com seu comentário. Acabei de concluir meu projeto de gravel e acabei por utilizar o microshift advent de 9 velocidades com freio a disco zoom DB680 a venda no aliexpress, deu certo e a bicicleta freia muito bem.
ExcluirEm um futuro próximo postarei aqui minhas configurações e impressões sobre o projeto. E em um futuro já mais distante penso em montar uma com as mesmíssimas configurações da que acabei de terminar, porém com o grupo sensah 2x9 que tive a oportunidade de ver ao vivo, muito bom também, mas com um preço que cabe no bolso.