Em segredo, te amei


Não te am(ei) como se fosse rosa de sal,
topázio ou flecha
de cravos que
propagam o fogo:
te am(ei) secretamente
entre a sombra e a alma...
a luz daquelas flores, e graças a teu amor viv(eu) escuro em meu corpo o apertado aroma que ascende da terra...
dentro de si, oculta,
Te am(ei) sem saber como, nem quando, nem onde,
te am(ei) diretamente sem problemas nem orgulho:
Assim te am(ei) porque não s(oube) amar de outra maneira
Se não assim deste modo em que não (fui) nem (fostes)
tão perto que a tua mão sobre meu peito (foi) minha
tão perto que se fecha(ram) teus olhos com meu sonho.
(Pablo Neruda)

Para quem não tem percepção suficiente, o texto acima foi intencionalmente adulterado para o maravilhoso tempo verbal pretérito perfeito... mas... e ai? Significa que o ato já acabou, chegou ao seu fim, terminou, esvaiu-se...

Afetos, nascem de um acordo mútuo entre almas apaixonadas entre si, algo, invisível, impalpável, onde apenas os envolvidos sentem e sabem que existe, ou seja, algo improvável para terceiros, em minhas palavras: religioso. Infelizmente, Amores como o descrito por Neruda, belos, puros, silenciosos, sem a necessidade de esnobar; não têm mais espaço perante uma sociedade líquida (que Bauman tanto descrevera até sua morte); o consumismo do rebanho, a ditadura da felicidade e a fluidez do dia-a-dia exigem cruelmente que usemos de artifícios para mostrar à todos que tal afeto é real: Anéis, festas, declarações públicas, papéis de cartório... Criamos rótulos, rituais e mais rituais na tentativa de solidificar um afeto... para que ninguém tenha dúvidas que ele realmente existe, inclusive o próprio casal.

Nada demais em querer seguir tais ritos sociais, as vezes pode ser divertido, não irá cair nenhum membro, além de facilitar a vida perante a lei, porém... quando as decisões viram dever compulsório; demonstra que o relacionamento já foi contaminado por projeções exógenas ou pior... Já não basta mais o mútuo acordo entre os que trocam o afeto, é preciso gritar e fazer barulho para que as pessoas batam palmas ou morram de inveja; isto apenas demonstra falta de confiança, base de qualquer relação; demonstra falta de amor, e dai a necessidade desesperada de ao menos "representá-lo" para ao menos cumprir papel social; demonstra insegurança e medo; ou seja... os envolvidos não respiram mais afeto, experimentam apenas a representação quase sem valor dele, uma verdadeira muleta que não deixa sairmos do chão e voar; o que na verdade acaba machucando... e muito... então, vem o efeito contrário, ao invés de solidificar o sentimento de afeto, transforma-o em pó; afinal, quando o poder entra por uma porta, o amor sai pela outra; Segundo o apóstolo Paulo, na bíblia cristã, isto seria como o metal que soa ou como o sino que tine, ou seja, uma relação fria. Por fim, Como dizia o profeta de Khalil Gibran: o amor nada dá senão de si próprio e nada recebe senão de si próprio; o amor não possui e nem se deixa possuir, pois o amor basta-se a si mesmo". Por isso, onde já não houver mais amor, apenas utilitarismo , representações e funcionalidade, não demora-te.

Desculpem o tom e a pessoalidade, mas precisava desabafar... afinal, como dizia meu queridíssimo Rubem Alves: Ostra feliz não faz pérolas. e aqui apresento-vos uma grande pérola minha.

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