O sonho de Everett Ruess



Dia destes estava lendo mais um daqueles livros que dão um nó na cabeça depois que acabamos de ler; "Na natureza selvagem", de Jon Krakauer. Posteriormente descobri que havia uma adaptação para o cinema; fui atrás super empolgado, mas... este não foge da regra geral: "o livro é melhor que o filme" e olha que nesta adaptação para as telas, o Eddie Vedder dá um espetáculo na trilha sonora.

O livro de Krakauer foi inspirado na trajetória de um jovem que só queria ser jovem, sem as amarras sociais que depois se transformam correntes e grilhões; para isto, o tal rapaz largou tudo e partiu rumo ao desconhecido das estradas e das relações humanas desinteressadas. Porém, para entender melhor a cabeça deste jovem, Krakauer realizou um bom levantamento de dados sobre "jovens aventureiros" e entre eles, estava Everett Ruess, na minha opinião, um verdadeiro mito entre aventureiros.

Everett Ruess (1914 - 1934) foi pintor e escritor que se aventurou sozinho pela natureza, seu ambiente mais inspirador eram desertos do sudoeste americano. Sobrevivia da pintura das paisagens que observava durante suas viagens. Everett não escreveu livros durante sua vida, mas os seus diários, arte e poesias foram mais tarde publicados em 2 livros: On Desert Trails (1940) e Everett Ruess: Vagabond for Beauty (1983). Aos 20 anos foi para o deserto do Utah com seus dois burros de estimação e desapareceu. Se você é como eu e teve dó dos burrinhos, saiba que foram encontrados pastando alegremente em uma espécie de oásis pouco depois do desaparecimento.

Apesar de solitário, Everett costumava escrever para sua família e por vezes, saiam algumas preciosidades:


"Senti-me sempre insatisfeito com a vida que a maioria das pessoas vive. Quis sempre viver de uma maneira mais rica e mais intensa. Para quê perder tempo escondendo os meus desejos mais profundos quando, falando deles, poderei encontrar alguém que os entenda e, vivendo-os, poderei descobrir quem sou?"

“Aventura é para os aventureiros.
Minha decisão está tomada.
Irei fazer o meu destino.
Que muitos outros jovens sejam por mim inspirados a deixar a segurança confortável de sua rotina,
e sigam o destino para outras terras.
Deus, como o selvagem me chama.
Não pode haver outra vida para mim senão a do errante solitário.
Tem um fascínio irresistível.
A trilha solitária é a melhor para mim."

Antes do completo desaparecimento, Ruess escreveu uma última carta ao seu irmão Waldo:
Em relação a quando visitarei a civilização, acho que não será em breve. Ainda não me cansei da natureza; pelo contrário, deleito-me cada vez mais com a sua beleza e com a vida errante que levo. Prefiro a sela ao carro e o céu salpicado de estrelas a um teto, prefiro a trilha obscura e difícil, levando ao desconhecido, a qualquer auto-estrada e a paz profunda do deserto ao descontentamento gerado pelas cidades. Censuras-me por ficar aqui, no lugar onde sei que pertenço e onde me sinto uno com o mundo à minha volta?

É verdade que sinto falta de companhia inteligente, mas há tão poucos com quem possa compartilhar as coisas que significam tanto para mim que aprendi a me conter. É-me suficiente estar cercado de beleza.

Mesmo com base na tua breve descrição, sei que não conseguiria suportar a rotina e o tédio da vida que és forçado a levar. Acho que nunca conseguirei fixar residência. Agora que conheço as profundezas da vida preferiria qualquer coisa a um anticlímax.

Digam que passei fome, que andei perdido, estoirado,
que fiquei cego e queimado pelo sol do deserto,
que andei com os pés doridos, cheio de sede,
com doenças estranhas, sozinho, molhado e cheio de frio,
mas que vivi o meu sonho!


Everett Ruess e seus dois companheiros de jornada

Por curiosidade, ele costumava esculpir o nome “Nemo” nas rochas por onde passava, que em latim significa "Ninguém"; pode ter sido também uma homenagem a seu personagem preferido, capitão Nemo, de 20 mil léguas submarinas (se você não conhece...pare de perder tempo e leia, pois vale muito a pena).

Comentários

  1. Sensacional e, definitivamente, inspirador!

    "To live is to be happy, to be carefree, to be overwhelmed by the glory of it all.
    Not to be happy is a living death.
    Alone I shoulder the sky and hurl my defiance and shout the song of the conqueror to the four winds, earth, sea, sun, moon and stars."

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