Foi realizada em Bujaru/PA no dia 14.02.16 mais uma trilha organizada pela
E.A.R.T; esta, diferentemente de todas as anteriores que já participei, foi classificada como "difícil", "não recomendada para iniciantes", "não recomendada para pessoas sem preparo", "perigosa"; pois bem, preparo eu tenho e não sou mais iniciante já tem um bom tempo, porém, nunca havia participado de uma trilha "difícil" e a esta altura do campeonato, comecei a indagar se já não estava na hora de por meus limites na balança para ver até onde iriam; além do mais, gostaria de ter mais uma cidade do interior paraense visitada com uma bicicleta em minha lista.
De Belém até o porto da balsa em Santa Izabel
O município de Bujaru está localizado a aproximadamente 77 km de Belém, e existem algumas maneiras de se chegar lá, a mais rápida é se dirigir até o município de Santa Izabel (40 km de belém), em seguida, entrar na PA-140 e então seguir até o porto da balsa (mais 37 km), onde faz-se uma travessia de barco ou balsa; a travessia de ciclistas e pedestres é gratuita.
Fico feliz e excitado ao sair da região metropolitana de Belém para visitar algum canto interiorano; mas, nem certeza eu tinha se aguentaria uma trilha difícil.
De modo geral, depois de sair da região metropolitana, a estrada até o porto está em boas condições, alguns trechos carecem de melhor manutenção, mas nada que possa causar algum acidente grave ou danos pesados aos veículos desde que se mantenha a atenção. Como de costume ao viajar, fui agraciado com belíssimos cenários e as incríveis sensações de leveza e realização; pude acompanhar o nascer e o pôr-do-sol, respectivamente na ida e na volta; tenho pena de quem nunca levantou de madrugada para pegar a estrada.
|
Neblina típica das manhãs |
Porto da balsa e a travessia para Bujaru
Ao chegar no porto da balsa, senti um grande nojo; a grande maioria das áreas portuárias é suja e tem lama, mas esta estava tomada de muito lixo e muitas moscas (o suficiente para praticamente cobrir os vidros do carro), não que tenha muitas frescuras ou obsessões com limpeza, mas me incomoda muito ver um povo vivendo por opção em condições de pouca higiene, faço tal afirmação pois os estabelecimentos não possuíam lixeiras e muitos dos moradores e comerciantes jogavam lixo no meio da rua, já demonstrando que tipo de educação esse povo tem.
|
Porto da balsa em Santa Izabel |
Devido ao atraso de muita gente, inclusive de alguns guias, acabamos por perder a balsa, e por mais incrível que pareça, estas são bem pontuais e realmente não esperam por ninguém; boa parte dos ciclistas partiu e assim, o grupo ficou dividido em dois.
|
Balsa partindo com metade do grupo à bordo |
A solução foi contratar um barco para realizar a travessia do grupo remanescente; apesar de ter pequeno porte, couberam todos, inclusive com certo conforto, mesmo assim, alguns preferiram ir no teto para aproveitar o vento.
|
Contratando um frete sem seguro... |
|
Bujaru/PA |
Após uma travessia bem animada e tranquila, finalmente chegamos à Bujaru (que na linguagem indígena significa “boca da cobra”). Depois da decepção com o porto da balsa, já não estava esperando muita coisa boa pela frente, mas o início da cidade consegue ser pior que o porto: ruas sujas, praças abandonadas, quiosques de lanches sem lixeiras, frente das casas com entulhos, neste caso não seria exagero dizer que a entrada da cidade está largada às moscas.
|
Orla/Praça abandonados |
|
Infraestrutura e saneamento praticamente zero |
Início da trilha da abolição
|
Instruções antes da trilha |
Depois do grande asco de conhecer os portos, começa a parte interessante, afinal, não tinha como único objetivo conhecer Bujaru. Por se tratar de uma trilha para ciclistas mais experientes, as instruções iniciais foram bem encurtadas, bastando citar os tipos de terrenos que encontraríamos pela frente: Lama, ramais, descidas de 60 km/h, subidas bem íngremes, pedras soltas, matagais, galhos caídos e estradões de terra. O percurso todo contou com apenas um ponto de apoio, por volta do km 45.
De maneira geral, os primeiros quilômetros da trilha são bem leves e lembram muito os caminhos de Benevides, porém, por volta do quilometro 10 encontramos uma espécie de forno à esquerda do caminho, este serve como um ponto de referência e a partir dele, a trilha sofre mudanças drásticas; o que era plano, agora passa a ser morro e o que era subida, agora passa a ser parede, além claro, de muitas pontes e cercas pelo caminho.
|
Subidas e descidas constantes |
|
Paredes para testar as marchas mais leves |
|
Pontes elevadas e estreitas para testar o equilíbrio |
|
Obstáculos também constantes |
Orgulho partido
Segundo muitas cadeias filosóficas, o bem-estar vem através de realizações; e o orgulho seria um sentimento quase que egoísta de satisfação pela própria capacidade ou realização, é uma glória incomparável pelo objetivo alcançado através do próprio mérito, logicamente que o bom e verdadeiro orgulho precisa ser merecido (uma vez que não é possível mentir ou enganar a si próprio). Não poderia deixar de me sentir muito orgulhoso pelo feito de montar minha própria bicicleta e com ela vencer muitos e muitos obstáculos, infelizmente bem no meio do nada (por volta do km 30) um galho caiu entre a roda, a gancheira, o quadro e o câmbio, e bem como dizem os ditos populares, a corrente quebra no elo mais fraco, neste caso sobrou para a gancheira e esta se partiu.
A gancheira funciona como uma proteção para o câmbio e para o quadro, ao invés do dano quebrar algum destes componentes, a gancheira é que vai ser a sacrificada. Apesar de ser muito difícil, a quebra de uma gancheira acaba com qualquer pedal, mas depois de partida, existem algumas opções:
- Substituição da gancheira
- Carregar a bicicleta por quilômetros
- Encurtar a corrente, retirar o câmbio e ficar com apenas uma marcha
Por ser algo difícil, nunca acreditei que poderia acontecer e logo comigo, não tinha gancheira reserva e estava muito longe de qualquer lugar para carregar a bicicleta, logo, me restou apenas a opção 3 e assim, encurtamos a corrente e fiquei com a marcha 3/10 (pesada, mas não a mais pesada); recebi muitos presságios ruins dos colegas de trilha, pois o pior trecho em termos de subidas ainda estaria por vir, uma zona batizada de linhão pelos veteranos; ainda segundo estes colegas, eu precisaria pedalar como marajoara, bruto, forte, com pé de chumbo, encarando subidas de marcha pesada, felizmente meu condicionamento físico estava em dia. Em outros tempos teria me envergonhado pelo adjetivo marajoara, mas depois de aceitar as raízes, nada mais pode nos envergonhar.
|
"Linhão" e suas descidas de 60 km/h e subidas íngremes |
|
hora de respirar fundo e encarar subidas com a marcha pesada |
|
Antares sem câmbio, no melhor estilo marajoara |
Fim da linha
Depois de ter a gancheira partida e a corrente encurtada, a blocagem da roda traseira também resolveu entrar em greve e empenou, soltando a roda, quebrando a corrente no processo, por volta do quilômetro 45; apenas para mais uma informação, em alguns quadros (como o da antares), a gancheira também faz o papel de segurar a roda traseira. Sem câmbio, sem blocagem e sem corrente...não tem como pedalar e assim acabou meu pedal "difícil", e tudo isso, por causa da quebra de uma peça que custa R$ 18,00, não pesa muito, não ocupa muito espaço, mas que muita gente (inclusive eu) não leva na mochila. Por sorte, já estava em um lugar povoado e pude arrumar um frete para me levar até o porto.
|
Antares ao final da trilha, impossível pedalar, sem câmbio, sem gancheira e sem corrente |
Considerações para as próximas trilhas
|
Luvas pela metade...não aconselho |
Toda esta experiência em Bujaru serviu para mostrar que ciclista precavido vale por dois e que pequenas peças fazem grande diferença. Além de obviamente começar a andar com uma gancheira reserva, também vou passar a andar com: alicate de abrir correntes, pois apesar da corrente KMC 10 ter missing link que teoricamente pode ser aberto com as mãos, este não se move muito fácil depois de encaixado e lubrificado; luvas integrais, pois ajudam a segurar melhor objetos ou a cair sem machucar os dedos; mochila com maior capacidade, trilhas mais duradouras exigem mais água, mais ferramentas, e mais comida também.
Dados do passeio
Mais fotos da trilha
|
Amanhecer em Marituba/PA |
|
Reação de um ciclista diante de uma placa de combustível |
|
Primeiro e último ponto de apoio |
|
Volta de balsa para Santa Izabel |
Comentários
Postar um comentário